Reorganização curricular: mudança de paradigmas
13 março de 2015Por Paulo de Tarso Rezende Ayub
Um vínculo que jamais se romperá. Assim pode ser definida a relação afetivo-profissional de Leila Iannone (consultora da Escola desde a fundação) com a instituição Da Vinci e os agentes educativos que a compõem. A cada tratativa ou reencontro que mantém conosco, como interlocutora que congrega a sabedoria dos tempos vividos e a eterna novidade do mundo, reafirma seu compromisso com o ideário educativo de cuja formulação participou.
Convidada a discorrer sobre o currículo (tema de sua predileção e objeto de seu doutoramento em Educação), em tarde de formação para a equipe técnica e professores voluntários, ela ponderou que a dimensão curricular já foi trabalhada em outros momentos da trajetória da Escola, o que assume uma significação simbólica pulsante, nestes tempos de celebração do nosso jubileu de prata: a dicotomia entre Parmênides (permanência) e Heráclito (correr contínuo), como marca institucional.
Leila pontuou que o olhar aprofundado sobre o currículo – como conjunto de ações intencionais e não intencionais; ou estreitamento das formas de comunicação, relações entre os que educam e os que são educados (entre si e com a comunidade externa), repertórios culturais e de vida – já estava presente na primeira hora da Escola, sempre foi retroalimentado nas trilhas do caminho e emerge como tema de última hora. Uma demonstração de coerência e foco; de inquietação e aprofundamento.
A qualquer ponto de vista que se lance sobre o currículo, trata-se de dado revelador sobre a compreensão da função educativa e das formas/processos pelos quais os indivíduos (professores e alunos em alternância de papéis como ensinantes/aprendentes) aprendem, formam-se e aprimoram-se. As contingências sociais, culturais, econômicas e políticas de um mundo em transformação impactam o currículo de forma incisiva, exigindo das Escolas uma missão transformadora, não mais periférica; protagonismo, em lugar da transversalidade; paradigmas emergentes em lugar de dominantes.
Uma abordagem priorizada por Leila foi o desafio que se impõe às escolas de fugir à tendência de, sob uma roupagem de aparente inovação, limitar-se a “fazer mais do mesmo”, uma máxima que funciona em diferentes áreas da realidade nacional. Deixar um pouco de lado a autoridade do conhecimento e a erudição para incorporar contribuições da Antropologia, Psicologia, Filosofia, Gestão de Negócios, Comunicação e outros campos olhados com reserva pelos catedráticos em Educação. Rumar para o desconhecido e o inusitado, canalizando o potencial das ferramentas tecnológicas para transformar pessoas e sociedades.
É preciso que Escolas e educadores encarem de frente a evidência de que, como pontua Mozart Neves Ramos do Instituto Ayrton Senna, “temos uma escola do século XIX, um professor do século XX e um aluno do século XXI” e que, para alcançar as atuais gerações em seus centros de interesses e desejos de realizações, precisamos estimulá-los a que tenham mente, coração e vontade abertos para possibilidades, desconstruções e desafios – aprendendo a aprender por todos os poros.
O grande desafio do currículo atual é formar homens que se projetem como futuros líderes e que ajudem a edificar um mundo melhor, pautado pelos direitos humanos, dignidade no trabalho, preservação do meio ambiente e combate à corrupção. Homens que se apropriem de suas experiências de vida para construir aprendizagens sobre si próprios, os outros e o mundo; que pratiquem a gestão sustentável da mente, o empreendedorismo e a gestão social.
Aos educadores, cabe o desafio (indelegável) de redirecionar sua atuação, transitando da transmissão de saberes constituídos para a mediação consciente, a curadoria do conhecimento, a visão de enredamento/conexões entre currículo e realidade.
A busca pela reorganização curricular (motivo de angústia ou estímulo, dependendo de como se lide com ela) também não tem um prazo fixo para acontecer ou um formato preestabelecido, já que vai muito além de matrizes de conteúdos habilidades ou competências. Deve impregnar atividades de rotina e ampliações culturais, manifestando-se em permanências, retiradas e introduções que tragam em si o germe da educação responsável: economia do conhecimento, plataformas de liderança sustentável, domínio crítico das tecnologias, princípios universais planetários.
Após essa contextualização trazida por Leila, tão antenada com movimentos contemporâneos (de teóricos e práticos) que aliam filosofia e pragmatismo em Educação, cumpre-nos, no individual e no coletivo, introjetar aquilo que nossa “mente, coração e vontade” estejam dispostos a experimentar e vivenciar, sem nos dobrar a modismos ou metas inalcançáveis. Substituir o ativismo/imediatismo – por vezes tão tênues – pela epifania – a clarividência que instiga à recondução sentida e consciente.