Centro Educacional Leonardo Da Vinci

Por Paulo de Tarso Rezende Ayub

Vamos e convenhamos, uma escola não se faz de rupturas ou transições. A educação é um contínuo, em que se conectam passado e presente; retrospectiva e perspectiva; permanências e mudanças.

Numa escola de perspectiva cultural, então, nem se diga. Ao tempo cronológico, sobrepõem-se entretempos, sobretempos até contratempos. Sim, porque os tempos internos, emocionais e psicológicos falam mais alto que os tradicionais segundos, minutos, horas, dias, anos. Quando se pratica educação de verdade, espaços e tempos oscilam entre tangível e intangível.

A abertura do planejamento 2015/2016, no âmbito do Da Vinci, foi, para dizer o mínimo, curiosa. Qualificá-la de um momento poético, regado a cientificidade, ou científico, regado a poesia, seria questão de retórica. Soa mais justo considerá-la como um respiro emocional em meio às racionalidades, negociações e avaliações que um projeto educativo perene aciona em seus mentores e colaboradores.

Para além do apreciativo das palavras, o que fez diferença mesmo foi vivenciá-la, na doce companhia dos colegas de profissão, embalados pelas vozes emocionadas de nossos alunos a entoarem ícones da MPB ou pela execução virtuosa de Trenzinho Caipira, Beijo Partido e versões de clássicos do jazz/blues, fruto da aproximação entre músicos de nossa equipe e do entorno, profissionais das Artes que cultivam intimismo e cumplicidade que sensibilizam aos que os assistem.

A fala acolhedora e articulada de nossa Diretora Maria Helena, a transitar entre as singelezas da poesia e as mazelas da realidade nacional que nos aproximam mais dos Contos de Bruxas do que dos Contos de Fadas (com o detalhe de que a Caça às Bruxas anda a todo vapor), ressignificou o que nossa Escola representa, com sua firmeza de atuação e princípios, e que chega a soar contraditório, quando comparada passo a passo com o que se passa extramuros.

Com uma trajetória pautada na política de qualidade versus atendimento, e sem se render a facilidades, modismos ou dissimulações, o Da Vinci ministra uma aula de civilidade e cidadania. Mas nem só de racionalismos vive uma escola à frente do seu tempo: aqui se cultuam também os princípios da Arte-Scienza da insustentável leveza do ser. Aqui, celebra-se a Beleza e o Bem trazidos pelo conhecimento que situa, transforma, extrapola; pelas humanidades que perpassam o científico, o artístico e as conexões entre eles.

“Educadores são/devem ser o exemplo da comunidade. Sejamos atuantes, portanto, juntos representando e sendo representados”. “Nosso convite para a mobilização de nós, tão poucos, mas fortes, na luta por um país mais educado”. Palavras reflexivas e refletoras que moldam nossos pensamentos e ações para o desafio de mais um ano letivo, sem perder a esperança em meio ao clima de desalento que tem percorrido o país de ponta a ponta.

E então entra em cena (ou melhor, divide a cena conosco) o convidado número 1 do momento de abertura, “grande manhã de sua vida” (e das nossas também). Em companhia de sua mãe-educadora (chefe das jardineiras da Educação Infantil durante um bom tempo; esteio moral para o filho, segundo as palavras dele), o gênio criativo Dan Mendonça, alter-ego de Leonardo da Vinci bem à nossa vista, legou-nos pérolas fora dos jargões da Pedagogia e que, mesmo meio fora do script, trouxeram uma contribuição inestimável para que não nos voltemos apenas para as atribulações do cotidiano e da execução imperiosa.

• A Arte não é um privilégio dos artesãos e artistas, estando presente nos mínimos detalhes da vida cotidiana e dos labores da profissão.
• Qualquer indivíduo traz em si uma natureza multifacetada para desvendar.
• Encher linguiça e trocar conversas aparentemente sem prumo, a exemplo do que ocorre na gastronomia ao se produzir alimentos que mesclam sabores e temperos, é uma das práticas mais salutares da existência.
• A dupla personalidade é uma qualidade inestimável porque nos retira das zonas de conforto e nos faz praticar a heteronímia como um legado de vida e não uma dimensão meramente poética.
• A música é alimento para a alma e quem constrói sua vida tendo uma trilha sonora como pano de fundo extrai muito mais sabor das vivências.
• A arte deve bastar por si mesma e nunca se dobrar às formatações que as desconfiguram no que guarda de mais precioso: a espontaneidade, o autobiográfico, o inexplicável.
• O princípio da Arte-Scienza de Leonardo da Vinci deve ser uma máxima da vida, mas deve-se ter a sabedoria de aplicá-las ora em sintonia, ora na dosagem certa, ora com uma dimensão a se sobrepor à outra.
• Ninguém deve produzir Arte ou Ciência como uma exigência do mercado ou um exercício de vaidade/ostentação: elas valem por sua genuidade e por aquilo que revelam sobre a essência de seu produtor, principalmente para si próprio.
• A dimensão do sagrado e do transcendente não cabe em definições precisas: é um direito de escolha.
• Todos devem encontrar espaço, em suas agendas externas ou internas, para cultivar aquilo que os engrandece, sensibiliza, humaniza.
• As fontes inspiradoras nunca devem ser relegadas, pois são o diferencial na formação de homens e na moldagem dos destinos e projetos de vida.

Assim se mostrou para nós o médico que é também inventor de instrumentos cirúrgicos e musicais de alta precisão, artista em diferentes técnicas e estilos, escritor, pescador, contador de histórias e cultivador das relações humanas. Sem consultar o roteiro que trouxe para nortear sua explanação, deu uma prova viva de que a vivência vale mais que o discurso, que a sabedoria emerge do improviso, que os sopros da alma e do coração são uma forma legítima de ampliar repertórios. Uma fonte de inspiração, para vivermos nossa missão educativa com o  exercício da autoconsciência e o espírito da partilha, aliando racionalidade e emoção como dimensões inseparáveis.